segunda-feira, dezembro 08, 2014

O CUSTO DA CORAGEM


Veronica Guerin
Murilo Souza
Jornalista graduado pela Universidade Federal de Santa Catarina
Quando decidiu pisar nos guetos irlandeses para escrever matérias sobre o comércio ilegal de drogas e o enriquecimento vertiginoso dos barões do tráfico, a jornalista Verônica Guerin tinha uma proposta: contribuir para a diminuição do número de jovens viciados. Destemida e ousada, só percebeu o quanto havia se aproximado dos fatos e personagens envolvidos quando ela própria foi vítima de um atentado a bala que lhe atingiu a perna. Sem se deixar intimidar, seguiu a linha investigativa da reportagem mesmo sob constantes ameaças físicas e psicológicas. Mas em 1996, sua sina acabou sendo a mesma de outros 51 jornalistas naquele ano: perdeu a vida durante o exercício da profissão.
E são exatamente os últimos dois anos de vida da jornalista, desde que começou a escarafunchar becos, bares e mansões atrás dos responsáveis pelos cerca de 15.000 jovens viciados em heroína de Dublin, que aparecem recontados em O Custo da Coragem, sob direção de Joel Schumacher (Por um Fio, Em Má Companhia). A trajetória de Verônica já havia sido levada aos cinemas em Alto Risco (2000), mas os produtores do filme foram obrigados a trocar os nomes dos personagens principais e a modificar partes do roteiro original. Em Alto Risco, Verônica aparecia como Sinead Hamilton e era interpretada por Joan Allen.
O Custo da Coragem começa com o assassinato de Verônica, morta em seu carro ao sair de uma audiência que decidiria a cassação ou não de sua carteira de motorista por causa das inúmeras multas por excesso de velocidade. Na seqüência, uma série de letreiros explica, de forma resumida, o que supostamente teria levado ao assassinato.
Longe de ser um reflexo do que deve ter sido de fato o trabalho de apuração da jornalista, o filme peca por infantilizar algumas situações e por tentar fazer de Verônica um arquétipo de profissional, decidida e ciente de sua “missão”. 
Um exemplo desse tipo de comportamento que pouco se assemelha à realidade jornalística é quando a personagem aborda algumas pessoas perguntando ingenuamente se elas vendem drogas para jovens. Ou ainda, quando bate na porta da casa de um perigoso e temido chefe do tráfico, vivido por Gerard McSorley, e faz acusações incisivas sobre a origem de seus bens.
Mas graças às atuações de Cate Blanchett (Verônica Guerin) e  Gerard McSorley (John Gilligan), as boçalidades da personagem, heroificada pelo roteiro de maneira forçada, ficam ofuscadas pelo talento interpretativo. A própria continuação da cena em que John se sente desafiado na porta de casa e acaba espancando Verônica é uma boa prova disso.
VERONICA GUERIN (1958-1996)
Começou tardiamente na profissão, depois dos 30 anos, e gostava do jornalismo investigativo. Exemplo de determinação e coragem, sua vontade incessante por justiça fez com que pagasse com a vida a investigação a fundo sobre a máfia e o tráfico de drogas em Dublin, capital da Irlanda, durante a década de 1990. Denunciou também a ligação que alguns dos mais importantes gângsteres tinham com o IRA. Sofreu um atentado e chegou a ser espancada por um dos maiores mafiosos da cidade.
Depois do seu assassinato, a população da Irlanda se revoltou e foi às ruas fazer protestos, e os barões do tráfico tiveram seus bens confiscados e foram presos. Um ano depois do acontecido, os crimes caíram em mais de 50% na Irlanda.
"Fazer a diferença"
Penetrando no submundo das drogas, investigando profundamente as vielas tortuosas de uma cruel realidade, ousando contatar fontes perigosas, Veronica chegou a informações válidas e irretorquíveis, as quais começou a publicar em seu jornal, The Sunday Independent. O ódio dos políticos e da polícia foi outro problema para Veronica, pois esta cobrou deles ações para debelar o tráfico, as quais não aconteciam devido a uma da piores legislações do mundo. Após o assassinato de um criminoso, Veronica conseguiu informações ainda mais contundentes sobre o tráfico, nunca antes reveladas, o que ocasionou comoção na sociedade, atraindo para a jornalista ainda mais oposição, de vários lados.
As pesquisas de Veronica Guerin levaram-na a procurar um dos principais mafiosos de Dublin e interrogá-lo, em sua própria casa. Irritado, o criminoso espancou violentamente a jornalista na frente de sua (dele) residência. Outro incidente violento foram tiros de advertência disparados contra a casa da repórter. Casada e com um filho pequeno, Veronica justificava suas ações dizendo: "Eu não quero fazer isto, eu tenho que fazer. Eu tenho que escrever sobre coisas que importam. Eu sinto que devo fazer a diferença." E fez!
Uma rosa simbólica
Veronica Gerin foi assassinada em 1996, quando estava com o carro parado em um sinal, em Dublin. Seu filho tinha cinco anos, na época. O crime chocou o país e o mundo, abalando as estruturas políticas da República da Irlanda e resultando na revisão das leis vigentes contra o tráfico. Suspeitos e até provas não eram, até então, suficientes para a punição dos culpados. A morte brutal de Veronica alterou tudo isso e finalmente os criminosos começaram a ser presos.
O filme O Custo da Coragem (2003) traz a premiada atriz Cate Blanchet no papel de Veronica; um filme que recomendamos a todos os nossos leitores, uma vez que conta a história de uma grande mulher.

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